sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O CANGAÇO E O LENDÁRIO LAMPIÃO




VIVER É LUTAR, ESCREVER É NARRAR  AS LUTAS

Nando Poeta tem resgatado uma tradição muito presente na trajetória histórica do cordel brasileiro: a crítica social e o denuncismo político. Foi assim com Leandro, o pai do cordel: embora sua face mais conhecida seja a de contador de histórias, é na observação preciosa do dia a dia da cidade do Recife onde planta sua independência e competência poética. Esquecida nos recantos de um quarto escuro historiográfico, os que tentam desencorajar os escritos engajados jogam mais fuligem sobre ela para que seja consumida pela omissão. Mas ela está viva e grita. Em A seca do Ceará:

O governo federal
Querendo remia o Norte
Porém cresceu o imposto
Foi mesmo que dar-lhe a morte.
Um mete o facão e rola-o
O Estado aqui esfola-o
Vai tudo dessa maneira
O município acha os troços
Ajunta o resto dos ossos
Manda vendê-los na feira.

Quando das instalações do trem da Great Western no Recife, todos lotados que ninguém aguentava mais, Leandro escrevia a crítica política ferrenha em Os coletores da Great Western:

E se alguém for se queixar
Diz-lhe o inglês: — O senhor
Deve agradecer a mim
Ter trem seja como for.
Mim botar trem no Brazil
Para fazer-lhe favor!

Ou a denúncia sobre o governo federal em A crise atual e o aumento do selo:

O governo federal
Acha que a coisa vai bem
E diz: “o dinheiro é pouco.
Deste eu não dou a ninguém
Porque eu não solto um pássaro
Por um que algum dia vem.

Pois bem, esse traço da poesia de Leandro é abandonado de propósito, deixado de lado, como se fosse pequeno, mas não o é. Em verdade é uma continuidade da poética acintosa de Gregório de Mattos, o Boca de Brasa, que não poupava ninguém. Leandro é o seu continuador. E não só Leandro, os pais do cordel, todos, aumentaram o volume de sua voz ao refletir sobre política e sociedade. Francisco das Chagas Batista não deixou por menos, abriu sua caixa de ferramentas e emendou versos poderosos narrando a escalada da Coluna Prestes e a resistência do Estado em Os revoltosos do Nordeste:

O Coronel Luiz Prestes,
Guiando os rebeldes, sai
Do Paraná e Mato Grosso,
Atravessa o Paraguay
E segue rumo ao Nordeste
Onde a Esperança o atrai.

Chagas Batista chega a tomar partido contra a família Maranhão que dominava o estado do Rio Grande do Norte durante a primeira metade do séc. XX. Canta sua lira em A salvação do Rio Grande do Norte:

A família Maranhão
É quem está governando
Aquele pequeno estado
Que agora vai se agitando
E com salvação política
Muito cedo vai sonhando!

Enganam-se os que imaginam que ao poeta de cordel cabe apenas a delicadeza dos bosques e das fadas, a rigidez lúdica das pelejas, o aproveitamento dos contos tradicionais da oralidade ou o fácil caminho das adaptações dos sucessos literários oficiais. Engano dobrado. Os nossos clássicos, os pioneiros fundaram a tradição política no cordel. Nando Poeta é apenas um sucessor contemporâneo. Com ele, os temas mais atuais, os mais polêmicos, os que necessitam de maior apuro tornaram-se corriqueiros e irrigam toda uma faixa de público ávido por esse tema, militantes que são. Cordéis em defesa dos direitos da mulher, de respeito à diversidade sexual, de reflexão sobre bullying nas escolas ou sobre a saga da consolidação dos direitos dos trabalhadores são a voz do poeta na boca de um narrador engajado ou de um eu-lírico consciente. Agora com este O cangaço e o lendário Lampião toma ares de romancista ao contar a história do famoso Capitão já tão decantado no cordel brasileiro. Como diria o próprio Chagas Batista, um dos pais do cordel, em A encrenca da Paraíba:

Eu, como escritor do povo,
Costumo meter o dedo
Nos casos de sensação
Que não exigem segredo
E, como não sou chaleira,
Conto a verdade sem medo.

Aderaldo Luciano
Dezembro de 2012

A SAGA DE JESUÍNO BRILHANTE.



Quando se fala em cangaço, o personagem mais lembrado é aquele considerado o maior deles, o primeiro sem segundo, o intrépido e temível Lampião. Todavia a história nos mostra que outros abriram o caminho para que ele passasse e reinasse praticamente incólume, sem que fosse abatido. Mas a história deixa as suas marcas e os historiadores poetas ou poetas historiadores estão sempre em busca destas para inovar sua arte, criar novas obras, encantar seus leitores. O cangaço de fato é um dos assuntos preferidos do cordel, mas não o único, pois a literatura é abrangente, está em busca dos mais simples aos mais complexos dramas humanos.
É o caso do cordelista natalense Nando Poeta radicado em São Paulo há cerca de cinco anos e que espalhou a sua poesia para o Brasil. Chegou tímido na Luzeiro buscando ler os clássicos dos cordéis brasileiros. Mas o seu apelido - Poeta, somado à sua história de vida que inclui engajamento nos movimentos sociais, aos poucos se tornaram um convite para lançar as redes em águas mais profundas no mar gigantesco do cordel. E ele seguiu um conselho interessante: “não tenha medo”. Corajoso, arriscou-se a escrevinhar as primeiras estrofes. De uma humildade singular, virtude nem sempre presente na maioria dos escritores, foi mostrando seus versos aos amigos que tem em boa parte do país. Os verdadeiros o incentivaram e corrigiram, os falsos elogiaram, os orgulhosos o mandaram parar e seguir no sindicato, os bondosos o abraçaram e o cordel mandou que ele seguisse lendo Leandro Gomes de Barros, José Camelo de Melo entre tantos outros gênios dessa arte secular.
O mundo vivia o auge da crise financeira e em pouco tempo estava pronto o primeiro trabalho de sua verve, A Turbulência Econômica. E começava bem, pela maior e mais importante editora de cordel do Brasil, a Luzeiro, sonho de todo poeta que conheceu o gênero através de suas publicações. Em poucos meses, graças ao  engajamento a edição se esgotara, pois os sindicatos acolheram sua obra e a partir dela promoveram importantes debates. Mas o potiguar ousado percebeu que havia uma lacuna a ser preenchida no meio de outras categorias; foi quando homenageou as mulheres em Mulheres em luta; depois os trabalhadores com O primeiro de maio, e em seguida, sonhou longe querendo  a construção de uma nova central sindical de luta publicando então, A arte de lutar.
O sociólogo Nando sabe da importância do estudo e por isso buscou conhecer mais e melhor a história do cordel, seus autores, suas influências, o meio em que viveram e as condições em que espalharam sua poesia. Partindo deles também espalhou a sua. Após a experiência acumulada lança agora um trabalho a respeito do Jesuíno Brilhante, um homem bem sucedido em sua época, mas que resolveu trilhar pelo cangaço, deixando que a vingança e a violência dominassem o seu coração.
Depois de ler quase tudo que se referisse ao cangaceiro, é assim que Nando o apresenta:

Jesuíno Alves Brilhante,
Agricultor, fazendeiro,
Um homem bem-sucedido
Laçador e bom vaqueiro.
Mas querendo se vingar
Passou a ser cangaceiro.

Escrever sobre Jesuíno tornou-se um desafio, já que pouco se contou sobre ele. Mas o poeta cônscio de sua arte não o teme. É feito o garimpeiro que busca a pedra mais preciosa. Nestas estrofes encontraremos a intrepidez e a coragem de um cangaceiro que enxergava à frente do seu tempo. Homem que respeitava as mulheres, dando-lhes voz, vez, espaço e respeito.

Para entrar no seu bando,
Cumpriria o mandamento:
Não tocar no que é alheio,
Mulher, só no casamento.
Todos os membros que entrassem
Faziam esse juramento.

Roubar era de fato proibido ainda que fosse para servir ao bando. Mesmo entre os violentos existem regras a serem cumpridas. Mas viver à margem da lei e da ordem tem seu preço e com Jesuíno não fora diferente. A perseguição e a espada, a bala e o punhal estavam em seu encalço e por conta da sua rebeldia terminou tombando pelo poder constituído. O Estado só não tem força maior que o povo, pois este, caso queira, poderá desestruturá-lo. Todavia, no caso de Jesuíno era apenas ele o seu bando.
Aqui, Nando Poeta conduz o leitor a conhecer a saga de um dos mais importantes cangaceiros da história. Boa leitura.

Varneci Nascimento
São Paulo – novembro de 2012.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

IV ANIVERSÁRIO DA CARAVANA DO CORDEL E I SALÃO DO CORDEL



DATA: 06, 07 e 08 de Dezembro de 2012

Local: Biblioteca do Memorial da América Latina/SP (Estação Barra Funda do Metrô)

Quinta feira - 06/12/12

Abertura – 19h
João Gomes de Sá
Luiz Wilson
Márcio Dedéu
Zé da Lua – (Bloco do Baião)
(Lançamento do livro Vida e obra de Gonzagão, de Cacá Lopes)
Chico Salles

Sexta Feira - 07/12/2012
01 – O Universo do Cordel na Literatura Infanto Juvenil.
10h. Fábio Sombra
Mediador Varneci Nascimento

02 – Ilustração no Cordel: da capa cega à policromia.
14h. Marco Haurélio
15h - Lançamento do livro “A Cartomante” (Machado de Assis)
Adaptação para o Cordel de Antônio Barreto

19h - Sarau aberto:
Participações: Costa Senna, Nando Poeta, João Gomes de Sá, Moreira de Acopiara, Cleusa Santo, Chico Sales, Paulo Araujo, Suely Valeriano, Francis Osmar, Bosco Maciel, Geraldo Maia, Rousi Gonçalves, Zé Walter, Antônio Barreto.

Sábado, 08/12/2012
Cordel & Cinema.
10h - Aderaldo Luciano
Mediador Nando Poeta

15h: Lançamento coletivo
16h: Homenagens (Apresentação Aldy Carvalho e Cleusa Santo)
17h: Grupo de Teatro Estação Café – Guaxupé/MG
18h: Sarau (Coordenação Moreira de Acopiara)

Nomes que participarão do sarau:

Cacá Lopes, Aldy Carvalho, Eufra Modesto, Cleusa Santo, Benedita Dellazari, Josué Gonçalves, Luiz Wilson, Pedro Monteiro, Nando Poeta, João Gomes de Sá, Paulo Araújo, Suely Valeriano, Francis Osmar, Zé Walter, Geraldo Maia, Rousi Gonçalves, Jocélio Amaro, Bosco Maciel e demais poetas presentes.

20h: Encerramento, com o cantor Moraes Moreira e o Show Moraes pé de Serra.